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Entrevista: presidente da ZF comenta os planos da empresa

Publicado: 27 Agosto, 2008 - 00h00

Escrito por: CNM CUT

Wílson Bricio é engenheiro mecânico, pela USP de São Carlos, e pós-graduado em administração industrial. Carrega experiência em áreas de qualidade, engenharia e aftermarket em mais de vinte anos na área petrolífera, dos quais três na Alemanha.

Em 2001 foi atrás do que chama de realizar um grande sonho: trabalhar na indústria automobilística. Apaixonado por carros, motos e velocidade via o setor, de fora, como indústria dinâmica, tecnologicamente avançada e fascinante - e ainda vê, garante. Naquele mesmo 2001 chegou à ZF como gerente geral da área de transmissões.

Era um momento delicado: dois grandes clientes decidiram fazer seus câmbios in house. Seis meses depois passou à diretoria e vice-presidência na América do Sul. Hoje ele é presidente da ZF para América do Sul e está à frente de um agressivo programa de investimentos, R$ 664 milhões de 2008 a 2012, que pretende fazê-la crescer 12% ao ano até lá e mais do que quadruplicar a produção de transmissões. Além de entrada em novos segmentos de mercado um dos pilares para a realização do plano é amplo foco em exportações. Com o dólar onde está? Sim, garante Bricio. Como? Ele conta nesta entrevista.

O senhor chegou à ZF em 2001, quando o mercado estava em baixa e a empresa perdeu dois grandes clientes em transmissões. Como conseguiu reverter este quadro?

Em toda situação há uma ameaça e uma oportunidade. Ali, no caso, a oportunidade estava nas exportações, que eram pouco utilizadas na época. Não uma exportação oportunista, mas programa consistente de vendas externas, sem mérito de câmbio bom ou ruim. Na época chegamos a pensar se a divisão deveria continuar no Brasil ou não. Decidimos continuar, e para fazê-lo de forma sustentável investimos muito em projetos de exportação, pois havia possibilidades nos Estados Unidos e Ásia. Isso também ajudou a elevar os níveis de qualidade aqui, tornando-os iguais aos da matriz alemã.

Mas focar em exportações naquela época não complicou a situação da empresa agora, com taxa de câmbio perto de R$ 1,60?

Estamos nos retirando das exportações em dólar e reforçando as posições em euro.

Na prática isso significa exatamente o quê?

Exportar menos para os Estados Unidos e mais para a Europa. E no caso da Ásia negociar contratos em euro e não em dólar.

Suas projeções são muito otimistas, tanto quanto da própria empresa quanto para o mercado. Mas a inflação está pressionando, os custos de matéria-prima como aço estão subindo muito, além da mão-de-obra.

O aço é problema mundial, não local: o que acontece aqui acontece no resto do mundo, não diminui nossa competitividade. E pretendemos elevar os índices de produtividade também utilizando maquinário mais moderno, o que deve reduzir o impacto do aumento da mão-de-obra que, de fato, subiu nos últimos anos. Nossos investimentos são projetados para o longo prazo, não são lastreados apenas no mercado nacional. A parcela das exportações em nosso negócio subirá de 19% para 30%. Em euro, para mercados estáveis. Investimos para exportar no momento em que todos estão fugindo nas exportações, olhando só para o mercado interno.

Isso é o que se chama remar contra a maré...

Não sei se é remar contra a maré... O Brasil tem exportações muito lastreadas em dólar. Quem fechou contrato há três, quatro anos, com dólar na faixa de R$ 3,20, se não sair dele agora, com taxa a R$ 1,60, mão-de-obra mais cara, aço três vezes mais caro et cetera estará perdendo dinheiro. Acontece muito, mas não é o nosso caso. Entramos nas exportações dentro de um conceito estratégico.

Dentro do plano de investimentos há lugar para uma nova planta? Em cidade que hoje não possui unidade ZF?

Com um volume de investimento desse nível é temos a obrigação de analisar nossa distribuição geográfica produtiva, se é a melhor, se estamos produzindo nos lugares mais interessantes. Temos projeto para avaliar se o investimento ficará concentrado nas plantas tradicionais de Araraquara, São Bernardo do Campo e Sorocaba, no Estado de São Paulo, ou outro local. A maior parte do investimento é para transmissões, e fizemos análise de onde poderíamos fazê-las e apareceram outros três estados além de São Paulo. Mas um deles já foi descartado. Estamos na fase final de análise e logo decidiremos, até porque não temos muito tempo. Podemos, também, centralizar tudo em Sorocaba, pois a cidade tem a vantagem de custo logístico fenomenal, difícil de ser batido.

Difícil de ser batido até onde?

Por exemplo: uma diferença no custo de mão-de-obra de 20% na nossa estrutura produtiva não é suficiente para bater a vantagem logística de Sorocaba com relação ao parque de fornecedores que temos hoje. O custo logístico, hoje, com aumento de combustíveis, frete, o próprio tempo, estoque et cetera é um fator muito importante.

Um dos maiores aumentos de participação de mercado projetados pela ZF até 2013 está na área de transmissões para picapes médias. Isso se apóia em cenário de fornecimento para a atual gama de veículos desta faixa de mercado ou em um novo modelo?

A expectativa baseia-se em números projetados para um lançamento, um veículo novo.

De montadora que ainda não compete neste mercado?
...

Não é arriscado apostar tanto em um veículo novo, do qual não se tem certeza da reação do mercado, ainda mais por estar em faixa de preço mais elevada?

Nós acreditamos muito. Todas as experiências que tivemos até hoje com essa montadora foram muito frutíferas, de muito sucesso, e não vemos razão para não acreditar nessa também. Esse segmento está crescendo muito e esperamos que venha a crescer ainda mais nos próximos anos. Hoje fornecemos apenas para picapes grandes.

Há algum investimento projetado para a Argentina?

Lá o crescimento será apenas orgânico.

Por que?

Pelo tamanho da atividade que hoje temos lá. Antes havia uma unidade de transmissões, que foi transferida para o Brasil. Temos de lembrar que não estamos no maior mercado do mundo em termos de volume: quando se divide volume produzido em distâncias muito grandes o custo aumenta. E não vemos uma situação estável o suficiente na Argentina a médio e longo prazos que indique mão-de-obra, insumos ou outros fatores ligados a custo mais baratos lá do que no Brasil. Vemos, sim, que o nosso aumento de custos na Argentina é muito maior do que a inflação publicada. Creio que será necessário um ajuste em algum momento.

E com o aumento da inflação no Brasil o senhor acredita que será necessário em algum momento um ajuste aqui também?

Temos um mecanismo forte: a importação, devido ao câmbio e ao grau de investimento, que aumentará o fluxo de dólares no País. Aumenta-se os juros, a moeda se fortalece e a importação ajuda a regular a inflação. A médio e longo prazos não vejo isso como fonte de preocupação, mas este remédio cria problemas para novos investimentos. Isso gera menos condições de produzir para atender à demanda e debelar a inflação. Creio que a solução é uma política industrial muito bem definida: definir nossas vocações.

O senhor trabalha com qual projeção de produção total de veículos no Brasil em 2012?

4,5 milhões de veículos produzidos. É projeção conservadora, um pouco abaixo do que ouvimos do mercado e dos clientes. Mas boa parte do nosso crescimento, repito, está calçado em exportações.

Como a matriz da ZF na Alemanha vê o potencial da América do Sul?

Creio que o maior sinal da confiança em nós é justamente este investimento de R$ 664 milhões, o maior já liberado para esta região em toda história. A confiança de que um investimento aqui terá retorno está justamente na liberação do investimento.

Há algo neste panorama de longo prazo que a ZF vê no País que poderia atrapalhar os planos?

Falta de reformas, coisas fora de propósito como a que vemos agora, de proposta de aumento de impostos. Tínhamos de trabalhar para reduzir a carga tributária e não aumentá-la. Precisamos também desonerar investimentos. Mas em um cenário em que isso não se concretize o problema não será só nosso: será também de nossos clientes, nossos concorrentes, do País.

Fonte: Autodata

ZF