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Pepe Mujica: 'sem a força coletiva, não somos nada'

Publicado: 28 Agosto, 2015 - 00h00

Escrito por: CNM CUT

Crédito: Filipe Peçanha
Mais de 10 mil pessoas acompanhara a palestra Mais de 10 mil pessoas acompanhara a palestra
Mais de 10 mil pessoas acompanharam a palestra do ex-presidente uruguaio

O ex-presidente do Uruguai e atual senador José Pepe Mujica defendeu na noite de ontem (27), no Rio de Janeiro, o aperfeiçoamento da democracia e repudiou as tentativas de golpes de estado no continente. Ele foi aclamado por cerca de 10 mil pessoas, durante palestra na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

Aos 80 anos de idade, o político uruguaio foi intensamente festejado pela plateia, majoritariamente formada por jovens, que o ouviam entre momentos de completo silêncio ou de palmas entusiasmadas, marcadamente contra o materialismo capitalista e a favor da solidariedade humana. Ao ouvir dos presentes gritos de "não vai ter golpe", o político uruguaio fez uma acalorada defesa da democracia.

"Tenho dificuldade para entender, no momento, o que se passa aqui. Porém, aventura com o uniforme dos milicos, por favor; golpe de Estado, por favor; este filme já vimos muitas vezes na América Latina. Esta democracia não é perfeita, porque nós não somos perfeitos. Mas temos que defendê-la para melhorá-la, não para sepultá-la", disse Mujica, ouvindo, mais uma vez, a plateia gritar: "Não vai ter golpe".

Mujica não quis comentar a crise política no Brasil, mas afirmou que o país "tem força suficiente para superar as dificuldades". "O problema é que muitos de vocês só veem derrotismo e acham que nada serve. Se teve gente que se equivocou, deve ser punida, mas vocês têm que seguir em frente".

A palestra, inicialmente programada para ocorrer no Teatro da UUERJ, foi feita no anfiteatro, ao ar livre, com a colocação de telões em outros espaços do campi, para comportar todo o público. Mujica ressaltou a importância de os jovens seguirem com a luta política e defendeu a necessidade de serem solidários uns com os outros.

"Meus queridos, ninguém é melhor do que ninguém. Tenho que agradecer a sua juventude pelas recordações de tantos e tantos estudantes que foram caindo pelos caminhos de nossa América Latina. Vocês têm que seguir levantando a bandeira. Na vida, temos que defender a liberdade. E ela não se vende, se conquista. Fazendo algo pelos outros. Isto se chama solidariedade. E sem solidariedade não há civilização", destacou.

"Os estudantes têm que se dar conta que não é só uma mudança do sistema, é uma mudança de cultura, é uma cultura civilizatória. E não tem como sonhar com um mundo melhor se não gastar a vida lutando por ele. Temos que superar o individualismo e criar consciência coletiva para transformar a sociedade", assinalou Mujica.

Descriminalização das drogas
Um dos assuntos abordados pelo público, que pôde fazer perguntas ao ex-presidente, foi a questão da liberação do consumo de maconha no Uruguai, com base em lei aprovada no seu governo. Mujica fez questão de frisar que nenhum vício é bom, "exceto o amor", e explicou porque decidiu tomar tal atitude em seu país.

Ele defendeu que a descriminalização das drogas é o melhor combate ao narcotráfico. No Brasil, a descriminalização do porte de drogas pelo usuário está atualmente em julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF).

"Se queremos mudar algo, não podemos fazer do mesmo. No meu país, tomamos uma decisão. Como não podemos vencer o narcotráfico, pois de cada três presos, um é relacionado às drogas, ou por tráfico ou por delito que cometeu para conseguir dinheiro para comprar a droga, decidimos arrebatar o mercado. Isto não é legalização. É regulação", disse.

Durante seu mandato, de 2010 a 2015, o Uruguai aprovou a descriminalização da maconha, o casamento homoafetivo e a legalização do aborto.

"Iniciamos essa experiência no Uruguai e não sabemos no que vai dar, mas o que estava sendo feito não dava resultados. O narcotráfico é pior do que a droga. O que queremos é regularizar o consumo, assegurar que o consumidor possa comprar uma dose sem ter que recorrer ao narcotráfico", disse o senador.

"Nós não cremos que nenhum vício seja bom, salvo o do amor, todos os demais são ruins. Mas se o vício vai dominar uma pessoa, temos tempo de atendê-la, porque a temos identificada e conhecida. Se a deixo no mundo clandestino, ela vai seguir se aprofundando no vício," acrescentou.

A simplicidade do ex-presidente, que vive sem luxos, é uma das suas características. Para ele, os políticos devem viver como a maioria do povo e não como uma minoria privilegiada. "Se você se acostuma a comer na mesa dos ricos, pensará que é rico. Não há homem grande, há causa grande", completou Mujica.

A vinda de Mujica ao Brasil foi patrocinada pela Federação das Câmaras de Comércio e Indústria da América do Sul (Federasur), que o homenageou em evento na manhã de hoje na sede da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), no centro do Rio, onde discursou para cerca de 400 pessoas.

Neste sábado (29), Mujica participa, ao lado do ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, do seminário internacional “Participação Cidadã, Gestão Democrática e as Cidades no século 21”, em São Bernardo do Campo (SP). O evento é organizado pela Prefeitura (leia mais aqui).

(Fonte: Agência Brasil)

Mujica foi presidente do Uruguai entre 2010 e 2015. Militante do grupo de esquerda Tupamaro, ele foi preso político por 14 anos.