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Para incriminar Lula, jornais picotaram e trocaram falas de Marcelo Odebrecht

Publicado: 13 Abril, 2017 - 00h00

Escrito por: CNM CUT

É sintomático que, na era digital, quando informações são colocadas na rede à disposição de quem tiver interesse em conhecer os dois lados de uma mesma moeda, ainda haja espaço para manipulações. É o que ocorre na cobertura de uma parte da grande mídia em relação ao depoimento de Marcelo Odebrecht ao juiz Sergio Moro.

O canal do Estadão no Youtube foi um dos primeiros a divulgar os quatro vídeos, no final da manhã desta quarta (12). À tarde, as páginas principais dos jornalões estavam divididas da seguinte maneira: metade do espaço era usado para manchetes que acusavam Lula de receber milhões em propina, e a outra metade, para distribuir entre os citados na lista de Janot 2.0.

A chamada da Folha talvez seja uma das criações mais escandalosas. "Lula tinha R$ 40 mi em propina para sacar após o mandato, diz Odebrecht". Na matéria, frases de Marcelo foram picotadas e trocadas de ordem para parecer que Lula tomou um xeque-mate. Mais do que isso: Folha escondeu deliberadamente o trecho em que Marcelo Odebrecht diz que não tem nenhuma prova de que Lula, de fato, sabia ou pediu para usar os recursos do fundo que a Odebrecht criou e chamou de "saldo Amigo".

Uma outra narrativa
Mas tirar frases de contexto ou ignorar revelações que favorecem os acusados não foram os únicos expedientes adotados pela grande mídia no caso Odebrecht.

O exercício inverso, o de colocar cada peça ofertada pelo delator em seu devido lugar, permite uma visão mais ampla do tabuleiro.

Essa é a narrativa que não teve espaço nos jornais:

- Marcelo começou sua relação com Antonio Palocci em 2008, ocasião em que criou um fundo que foi "gerenciado" pelo ex-ministro, em sintonia com interesses do PT.

- Esse fundo só teve depósitos até 2010, depois disso, nunca mais. Mas Palocci teria gerenciado recursos para o PT até 2013.

- Ao explicar o significado de alguns valores lançados numa planilha apreendida pela Lava Jato, Marcelo revelou que de tudo que ele doou ao PT, via caixa 2 ou doação regular, apenas dois repasses tiveram uma contrapartida: um de R$ 50 milhões, que foi o primeiro a entrar no fundo, tinha relação com a aprovação do "Refis da crise"; outro, de R$ 64 milhões, dizia respeito a uma negociação do governo Lula com Angola para liberação de uma linha de crédito da ordem de R$ 1 bilhão. Marcelo afirmou que Lula teria concordado em liberar parte do crédito à Odebrecht em troca de uma contribuição de 40 milhões de dólares ao PT. Tudo, de novo, discutido apenas com Palocci. Como a Veja enquadrou esse a história: 

- A partir dos 22 minutos do vídeo, Sergio Moro pula para o que interesse: valores ligados a um Programa B, que Marcelo disse se referir a Branislav Kontic, assessor de Palocci. Todos os recursos ali disponíveis (R$ 13 milhões) teriam sido sacados em dinheiro vivo, entre 2012 e 2013.

- No vídeo, fica claro que as listas de Moro e Marcelo eram diferentes. Só na do juiz, que é um documento que aparece no relatório da Polícia Federal, um valor foi adicionado logo abaixo de seis repasses do Programa B. Foram os R$ 4 milhões que foram doados ao Instituto Lula. A Lava Jato usa isso para insinuar que além dos R$ 4 milhões, Lula teria sido o destinatário dos R$ 13 milhões em dinheiro vivo.

- Brani nunca conversou sobre valores ou pagamentos. Só cuidava da agenda de Palocci.

- Sobre a compra do terreno do Instituto Lula, Marcelo diz que foi procurador por Paulo Okamotto ou José Carlos Bumlai (não se lembra direito), porque Roberto Teixeira e o pecuarista teriam acertado a compra de um terreno, de R$ 12 milhões, que serviria à construção do IL. Marcelo diz que eles pediram para a Odebrecht comprar como uma "doação" e, depois, desistiram. O terreno foi vendido e o valor foi depositado num fundo chamado "saldo Amigo". O valor do terreno saiu do caixa gerido por Palocci.

- Sobre a doação de R$ 4 milhões: Marcelo disse que a intenção da Odebrecht era doar uma bolada de uma vez só ao Instituto Lula, mas que os responsáveis não aceitaram. Os R$ 4 milhões teriam saído do "saldo Amigo", solicitados a Alexandrino Alencar.

- Sobre os R$ 40 milhões: Marcelo disse que quando Lula saiu da presidência da República, a Odebrecht entendeu por bem separar recursos - o "saldo Amigo" - para atender qualquer "demanda" que pudesse surgir relacionada a Lula, pois o petista, ainda que aposentado, com certeza manteria influência sobre o governo Dilma e o PT. A existência do "saldo Amigo" foi avisada a Palocci. Os R$ 13 milhões do Programa B sairam desse caixa a pedido de Palocci e, apenas por isso, Marcelo entendeu que era uma "demanda" de Lula. Mas "não tinha como provar isso".

- O depoimento de Monica Moura sobre pagamentos por campanhas do PT descontrói o de Marcelo. Ele diz que disse a Dilma Rousseff que sua campanha de 2014 seria "contaminada" por caixa 2 pago na Suíça ao marqueteiro João Santana. Mônica Moura diz que os valores citados pelo empresário não estão relacionados à campanha de 2014 e tampouco foram pagos em contas no exterior.

(Fonte: Cíntia Alves - Jornal GGN)