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Para professor de economia, bancos e grandes corporações são 'os donos da crise mundial'

Publicado: 27 Agosto, 2015 - 00h00

Escrito por: CNM CUT

“Temos todo o necessário hoje para construir um mundo que faça sentido. O problema não é falta de recursos, é falta de governança”. Assim o economista Ladislau Dowbor, professor da PUC São Paulo, iniciou palestra ontem (26) no 3º Congresso Internacional de Ciências do Trabalho, Meio Ambiente, Direito e Saúde, realizado pela Fundacentro, Associação Latinoamericana de Advogados Laboralistas (ALAL) e Ministério Público do Trabalho (MPT), que ocorre na Faculdade de Direito da USP.

O professor foi enfático ao discorrer sobre as origens e responsabilidades pela atual crise econômica mundial. “A totalidade das chamadas commodities – grãos, petróleo, gás e minérios – está nas mãos de 16 tradings globais”, disse, ao referir-se à queda nos preços desse segmento nos últimos 12 meses. “Quando se pensa que os principais bens do planeta estão com 16 corporações, vemos que há um controle da economia mundial sem que se tenha um governo mundial”, avaliou.

Ele citou estudo do Instituto Federal Suíço de Pesquisa Tecnológica, que aponta: 737 empresas controlam 80% do sistema corporativo mundial. “Isso é gente que se conhece, nem precisa se procurar para conspirar. Trata-se de um verdadeiro oligopólio planetário, e 65% desse sistema corporativo é formado por bancos”, considerou Dowbor.

Crédito: Divulgação
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Dowbor: bancos à frente da crise brasileira

Para o professor, esse controle e financeirização da economia resultou numa dinâmica que hoje multiplica um sistema de quebradeira nos mais variados países: “O que hoje está acontecendo na Grécia, antes aconteceu no sudeste asiático e, antes disso, no México; também já aconteceu na Argentina”.

Com essa introdução sobre economia mundial, o professor abordou, em sua palestra, os desafios à consolidação do estado social democrático na América Latina.Também participou da mesa o ex-ministro de Relações Internacionais do governo Lula, o diplomata Celso Amorim.

“Contribuição” dos bancos
Ladislau Dowbor destacou o papel dos bancos na crise brasileira, a partir de dados do Banco Central sobre o endividamento das famílias: em 2005 correspondia a 19,3% da renda; em abril de 2015 pulou para 46,5% da renda. “Isso trava a economia”, argumentou, lembrando os exorbitantes juros bancários no país. “Um crediário no Brasil tem 100% de juros; na Europa é 13%. O rotativo do cartão de crédito alcança em média 300% ao ano. O cheque especial no Brasil chega a 200% ao ano, enquanto que na Espanha é 0% até seis meses. Hoje temos mais de R$ 20 bilhões empatados em dívidas de gente que está pagando cheque especial. Ou seja, crediários, cartões de crédito e juros bancários para pessoa física travam a demanda, pois o comprador paga em dobro pelo produto, assim endivida-se muito comprando pouco”, explicou o economista.

Também criticou os altos juros para pessoas jurídicas. “Para completar esse quadro, a alta da Selic provoca a transferência de centenas de bilhões dos nossos impostos para os bancos, o que trava a capacidade do Estado de investir em infraestrutura e expandir políticas sociais”, disse, referindo-se aos títulos da dívida pública, indexados pela Selic. “Assim, completa-se o quadro dessa bandidagem absolutamente fenomenal que está drenando recursos do nosso país”, completou.

Interesses na crise
Dowbor lembrou os avanços sociais que o país teve nos últimos anos, com o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) crescendo 31% entre 1980 (0,549) e 2011 (0,718), desempenho que foi puxado pelo aumento na expectativa de vida (de 62,5 anos para 73,5 anos), pela melhora na média de anos de escolaridade (4,6 anos a mais) e pelo crescimento da renda nacional bruta per capita (quase 40% entre 1980 e 2011). “E vamos dizer que o país está quebrado?”, questionou.

“Os resultados são gigantescos, muito sólidos. Essa crise não é uma crise econômica, é uma crise levada por interesses políticos. Temos uma aliança do sistema financeiro, da mídia e de parte do Judiciário. E não vamos nos esquecer do Congresso Nacional, que é eleito por corporações; por isso, temos a bancada ruralista, a dos bancos, a das empreiteiras, das montadoras... E nós ficamos à procura da bancada do cidadão”, assinalou Ladislau Dowbor, completando: “Tivemos isso em 1954 (ano em que Getúlio Vargas se suicidou). Tivemos também em 1964 (ditadura militar) e estamos tendo isso de novo hoje. Não passa pela goela das nossas oligarquias que haja uma democracia, e isso não só nos ameaça aqui, como ameaça o continente latino-americano e o mundo.”

(Fonte: Rede Brasil Atual, com reportagem de Andréa Ponte Souza, do Sindicato dos Bancários de São Paulo)