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Siemens define novos rumos e acelera mudanças

Publicado: 05 Setembro, 2006 - 08h00

Escrito por: CNM CUT

A Siemens, gigante do setor de engenharia e eletrônica com sede em Munique, é famosa por ser competente, mas um pouco lenta. Os lucros raramente se comparam aos dos rivais, como a General Electric. Klaus Kleinfeld, executivo-chefe da empresa desde o início de 2005, quer mudar isso. Maratonista nas horas vagas, o executivo definiu metas ambiciosas para todas as divisões da Siemens, que fabrica desde máquinas de raios X até injetores de gasolina e geradores de turbinas hidrelétricas. Também se desfez de unidades de baixo desempenho, vendendo operações como as de telefones celulares.

Nesta entrevista , o executivo descreveu como pretende aproveitar a presença global da Siemens para lucrar com 'megatendências', como a demanda gerada pelas obras de infra-estrutura nos países em desenvolvimento. Seguem abaixo partes da conversa.

BusinessWeek: No passado, você comentou sobre várias megatendências na sociedade e no mundo. O que isso significa para uma empresa como a Siemens?

Klaus Kleinfeld: Vamos ver o que está ocorrendo neste planeta. Um aspecto é a mudança demográfica: o aumento e envelhecimento da população e a urbanização. As pessoas estão se mudando para as cidades na esperança de ter uma vida melhor. Isso ocorre de forma maciça em todo o mundo. E se observo o que será necessário, logo vejo todas nossas tecnologias. Não quer dizer que estejamos adaptando nossa estratégia com base nas megatendências, mas elas nos trazem vento a favor. Vemos isso, mergulhamos e dizemos: vamos surfar esta onda. E é uma onda de longo prazo, com um longo caminho até a orla.

BusinessWeek: Mas como a Siemens aproveita o vento a favor, essas tendências?

Kleinfeld: A forma como eu colocaria é: 'como posso capitalizar isso?' Acho que há três áreas que podemos capitalizar. Uma é a de energia e meio ambiente. A segunda é a de saúde. E a terceira é toda a área de infra-estrutura pública e industrial. A Índia tem 1,1 bilhão de habitantes. Atualmente, 350 milhões deles são considerados de classe média. Isso significa que possuem um apartamento e que mandam seus filhos para uma escola razoavelmente boa. Então, o que vem a seguir? Eles dizem 'temos uma moto; agora queremos um carro'. Isso aciona toda uma cadeia de eventos para nós. Há uma imensa indústria automotiva explodindo na Índia. Somos muito fortes no que se refere à eletrônica automotiva. Também somos muitos fortes em administração do tráfego e infra-estrutura. E com mais pessoas mudando-se para as cidades, o que será acionado a seguir? Infra-estrutura de telecomunicações, infra-estrutura de água, transportes de massa.

BusinessWeek: E sobre a energia e meio ambiente?

Kleinfeld: A melhor forma de protegermos o meio ambiente é aumentando a eficiência. Estamos trabalhando muito arduamente para tornar nossas turbinas a gasolina mais eficientes. Somos muito bons no que se refere a lâmpadas de economia de energia. Criamos um grupo que pode entrar em um prédio, analisar o consumo de energia e sair com sugestões de maior eficiência. Por exemplo, em aeroportos, combinamos os sistemas de calefação ou resfriamento com o de partidas e chegadas. Um portão só é acesso e aquecido ou resfriado 15 minutos antes de ser usado. O resto do tempo fica bloqueado. Estamos construindo uma usina eólica em Iowa que empregará 250 pessoas. Há muito entusiasmo com a energia térmica. É sensato - parte você usa como eletricidade, parte como aquecimento. E nos Estados Unidos temos usinas de energia nas quais queimamos lixo.

BusinessWeek: Qual o tamanho destas operações? Essas tecnologias ainda são um nicho em comparação com as usinas alimentadas a carvão ou gás?

Kleinfeld: Sim, são. Mas a energia eólica cobrirá 5% ou 6% da oferta total de energia. Então, realmente, deixará de ser um nicho. Também é importante fazer turbinas a gás mais eficientes. E o maior problema é como transformar carvão em energia sem emitir tantos poluentes. É por isso que a gasificação do carvão tornou-se uma inovação importante. É possível usar o gás ou liquefazê-lo e usá-lo em carros e caminhões. E é possível separar o gás carbônico antes de queimá-lo. Então você pode enviá-lo pelos oleodutos já existentes e jogá-lo nos campos petrolíferos. O CO2 pode dissolver o petróleo, o que permite extrair mais petróleo de campos antigos.

Há três áreas que podemos capitalizar: energia e meio ambiente, saúde e infra-estrutura pública e industrial.

BusinessWeek: A terceira tendência que você mencionou é a demanda na área de saúde. Qual o potencial e onde pode haver crescimento?

Kleinfeld: Hoje, temos 6 bilhões de pessoas neste planeta e, muito em breve, provavelmente seremos 9 bilhões. Cada indivíduo precisa cuidar da saúde. O segmento que mais cresce atualmente é das pessoas com mais de 80 anos. Todos estamos vivendo mais, o que, por si só, comprova que a medicina nos fez bem. Ao mesmo tempo sabemos que prolongar a vida só é prazeroso se formos saudáveis.

BusinessWeek: Então, no que se refere à Siemens, como você aproveita essa oportunidade?

Kleinfeld: Os sistemas de tecnologia da informação, por exemplo. A base disso é o registro eletrônico do paciente. Acreditamos que podemos reduzir os custos e elevar a qualidade. Na realidade, o sistema de informações de 'alta tecnologia' que existe atualmente em vários hospitais é o médico entregando à enfermeira um pequeno bilhete. Infelizmente, muitas enfermeiras não ousam perguntar ao médico o que significa aquilo exatamente. É daí que se originam muitos erros.

Atualmente, as enfermeiras estão sob uma pressão inacreditável. Quando uma enfermeira cansada está separando as pílulas da noite de um paciente, não se tem idéia com que freqüência ela, cansada, pode voltar a colocar as mesmas pílulas para a próxima vez. Conectamos nosso sistema a um simples armário para os remédios, com um scanner e pequenas portas. O computador mostra a ordem do médico, indicando a medicação, a enfermeira aponta o scanner para a porta e se não combinar com o remédio, a porta não abre.

BusinessWeek: Isso envolve muitos softwares. Qual o tamanho da Siemens em programas de computação?

Kleinfeld: Quando comecei em 1987, ainda tínhamos muitos engenheiros eletromecânicos. Atualmente, temos aproximadamente 55 mil pessoas em pesquisa e desenvolvimento, sendo 33 mil engenheiros de software. Portanto, temos mais que a Microsoft. Mas estes são tipos diferentes de softwares. Há softwares para a área de saúde que são parecidos ao material da Microsoft. Mas há muitos softwares que são inseridos no sistema. Por exemplo, uma turbina a gás gira tão rápido que as lâminas ficam incandescentes. Há quantidades enormes de sensores no local e há quantidades enormes de softwares respaldando-os.

BusinessWeek: A Siemens precisa ser como é? Qual o sentido de um conglomerado tão incrivelmente variado? O que aparelhos médicos têm a ver com turbinas a gás e trens? Não seria mais sensato desmembrar-se?

Kleinfeld: Toda essa discussão de conglomerado é um sinal de que estou ficando velho. Porque agora é a terceira vez que vejo (a discussão) passar do preto para o branco. Mas a questão básica continua: qual o valor da Siemens? E acho que temos respostas muito boas. No ano passado, compramos uma empresa que é líder mundial em caixas de transmissão. Soa como uma parte industrial pouco atraente. Então, por que isso ocorreu? Nós a integramos ao nosso negócio de automação industrial. A empresa fornecia, digamos, para 20 países. (Agora) abrimos o produto para 190 países. Os produtos são muitos bons e rapidamente se esgotaram. Essa é a sinergia que vem da força de vendas.

BusinessWeek: Sua equipe que vende aparelhos médicos sabe como vender caixas de transmissão?

Kleinfeld: Não, não, mas este exemplo realmente nos mostra a sinergia em um grupo relevante de negócios. Se você quer chegar a um alto nível, somos a única empresa que vende um conceito como um aeroporto digital ou um hospital digital. Podemos negociar com uma empresa de serviços hospitalares que pretenda construir um hospital e dizer: veja, vamos discutir os equipamentos de diagnósticos. Mas, temos mais do que isso. Vamos discutir os equipamentos de laboratório. Não é tudo. Vamos discutir toda a infra-estrutura de tecnologia da informação de seu hospital. Não acaba por aí. O consumo de energia é um grande problema, já que os hospitais são instalações imensas. Telecomunicações. Nós sabemos como fazer isso. Então, atualmente, no que se refere a um hospital, com exceção do concreto, ou temos em nossa linha de produtos ou, pelo menos, temos muito conhecimento a oferecer. No lado de pesquisa e desenvolvimento, nosso centro em Princeton faz reconhecimento de padrões. Soa pouco atrativo, mas na verdade é muito. É possível aplicar o reconhecimento de padrões nas imagens médicas e, também, em todos os outros tipos de imagem. Portanto, desenvolvemos um algoritmo inteligente para distinguir entre um mergulhador saindo da água e a maré que começa a chegar. Agora, está sendo utilizado no centro de lançamentos (de ônibus espaciais) em Cabo Canaveral. Outra área de sinergia são as pessoas. Um dos motivos pelos quais me juntei à Siemens é porque sabia que tinha presença internacional e muitas operações que pareciam interessantes. Então, entrei. E isso é bem atrativo para muitos (dos funcionários) de alto desempenho que temos.

Fonte: Valor