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Sindicatos usam hashtag da Nissan para denunciar montadora nas redes

Publicado: 03 Agosto, 2016 - 00h00

Escrito por: CNM CUT

Crédito: Reprodução
Trabalhadores realizaram protesto contra a empresa durante a passagem da Tocha OlímpicaTrabalhadores realizaram protesto contra a empresa durante a passagem da Tocha Olímpica
Trabalhadores protestaram durante a passagem da Tocha Olímpica

A hashtag #QuemSeAtreve, criada em uma ação publicitária da Nissan, acabou se voltando contra a montadora. A ação foi incentivada por entidades sindicais internacionais – IndustrialALL, que reúne federações de trabalhadores do setor produtivo em todo o mundo, e UAW, que representa trabalhadores do setor automobilístico dos Estados Unidos, Canadá e Porto Rico. A companhia é alvo de uma campanha global que denuncia condições inadequadas de trabalho de empregados de terceirizadas, na planta de Canton, no Mississippi (EUA), e de intimidação para que os trabalhadores não se associem à UAW.

O movimento virtual “sequestrou” a hashtag e realizou um tuitaço na última sexta-feira (29), atingindo 26 milhões de usuários e mais de 4.200 citações. A estratégia parte do princípio de que a hashtag é livre e está suscetível a mudanças e transformações pelos usuários da internet. A Confederação Nacional dos Metalúrgicos (CNM/CUT) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos (CNTM-Força Sindical) reproduziram a "anticampanha".

As entidades monitoraram as citações ligadas à hashtag #QuemSeAtreve entre 18 e 29 de julho. O pico de uso no período ocorreu durante o tuitaço de sexta-feira. Entre os principais perfis engajados na ação estão os dos senadores Roberto Requião (PMDB-PR) e Paulo Paim (PT-RS), o da União Nacional dos Estudantes (UNE) e o do coletivo Jornalistas Livres.

Entre as palavras mais utilizadas estão "trabalhadores", "direitos, funcionários", "trabalhistas", "respeito". O perfil oficial da Nissan também foi citado e aparece como o segundo termo mais utilizado entre as citações capturadas. Imagens de trabalhadores em greve e ações ironizando a Tocha Olímpica, já que a empresa é uma das principais patrocinadoras dos Jogos Olímpicos, também tiveram grande compartilhamento. As fotos do protesto atingiram um público maior do que outras imagens oficiais utilizadas pela montadora.

No último dia 24, pelo menos 200 trabalhadores metalúrgicos e comerciários realizaram protesto contra a empresa durante a passagem da tocha por São Paulo, na Avenida Paulista e em frente à loja da Nissan na Avenida Brasil, na zona oeste, onde foi carregada pelo cantor sertanejo Daniel e permaneceu na concessionária por 30 minutos.

Entenda o caso
Os sindicatos denunciam que os trabalhadores terceirizados da Nissan (que compõem pelo menos um terço do quadro) ganham menos de um terço do salário dos contratados, apesar de exercerem a mesma função, não tem direto a férias remuneradas, possuem planos de saúde precários e realizam jornadas maiores. Além disso, como os demais funcionários da empresa, são submetidos e reuniões nas quais são intimidados a não se sindicalizarem.

Nos Estados Unidos, é preciso que os trabalhadores de uma determinada empresa decidam, por meio de eleição, se aceitam o sindicato, no caso a UAW, como sua entidade de representação. A empresa promove campanhas sistemáticas para constranger os funcionários a não pleitear a eleição.

A montadora usa refeitórios e salas de descanso para projetar vídeos que desvalorizam sindicais e chegou a ameaçar trabalhadores de demissão caso votem pela aceitação do sindicato, ameaçando transferir a fábrica para o México. “É uma política de terrorismo e medo”, disse o representante de relações internacionais da UAW no Brasil, Rafael Guerra. “A empresa passa vídeos de doutrinação, em todos os turnos, todos os dias, falando para trabalhadores não se filiarem. Depois os chamam em salas fechadas e perguntam qual a opinião de cada um sobre os sindicatos.”

Esse tipo de práticas não está de acordo com o Código Básico da Iniciativa Ética Comercial, que compõe o Guia da Cadeia de Suprimentos Sustentável dos Jogos Olímpicos, assinado pela Nissan como uma das principais patrocinadoras da competição. Segundo o documento, os trabalhadores das empresas patrocinadoras devem ter liberdade de associação e direito a negociação coletiva.

Entidades sindicais brasileiras e internacionais já pediram formalmente ao Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos que exija da Nissan um plano de ação corretivo. Em 11 de abril, durante audiência pública na Comissão de Direitos Humanos do Senado, trabalhadores e representantes de sindicatos cobraram da Nissan que a empresa respeite o direito dos trabalhadores norte-americanos a sindicalização.

A IndustriALL Global Union e a UAW continuam sem acesso a negociação com a montadora. Na semana passada, o parlamentar francês Christian Hautin – a empresa é controlada pela Renault – esteve na fábrica do Mississipi. Apesar da insistência, ele não foi recebido pela diretoria da empresa.

"Um dos principais problemas é a precarização das leis trabalhistas. Nos Estados Unidos não existe uma legislação completa, como aqui. O que aconteceu é que muitos trabalhadores da fábrica são terceirizados há anos. São chamados de temporários permanentes", diz Rafael Guerra, para quem a prática provoca "uma reflexão" sobre os riscos para os trabalhadores do Brasil representados pelos projetos de flexibilização das leis trabalhistas e de ampliação das terceirizações, defendidos pela base de apoio ao governo interino de Michel Temer.