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Voto de mulheres negras derrota aliado de Trump acusado de assédio

Publicado: 14 Dezembro, 2017 - 00h00

Escrito por: CNM CUT

O voto de mulheres negras e o impulso da campanha #metoo, que trouxe à luz casos de assédio e agressão sexual no showbiz e na política dos EUA, deram ao Partido Democrata sua primeira vitória em 25 anos em uma disputa para o Senado travada no Estado do Alabama.

Na terça-feira (12), o promotor federal Doug Jones, 63, derrotou o juiz federal Roy Moore, suspeito de estupro de vulnerável por causa de sua relação com adolescentes nos anos 80 (incluindo com uma de 14 anos), por pouco mais de 20 mil votos, segundo resultado divulgado na madrugada desta quarta.

Moore, 70, nega as alegações e até a noite de quarta não admitira a derrota.

No ano passado, o Estado sulista, tradicional reduto republicano, preferira Donald Trump para a Presidência por uma margem de 28 pontos sobre Hillary Clinton. Mas as denúncias de cunho sexual contra Moore derreteram a vantagem de 20 pontos percentuais que o juiz conservador mantinha nas pesquisas.

Pouco adiantou o apoio declarado por Trump ao correligionário no fim de novembro, após alguma hesitação, para tentar manter a maioria de 52 cadeiras no Senado.

A derrota de Moore se soma à aposentadoria ou renúncia nos últimos dias de três congressistas acusados de assédio ou agressão sexual e mostra a força do movimento #metoo ("eu também"), em que mulheres expuseram em redes sociais e páginas de jornal a violência sexual que sofreram.

O próprio Trump está no alvo de uma campanha de congressistas mulheres que pedem que ele renuncie em razão de 16 denúncias de assédio sexual contra o presidente surgidas desde a eleição. A embaixadora dos EUA na ONU, Nikki Haley, a mulher mais proeminente do governo Trump, defendeu a investigação das alegações.

"Ante as opções, os eleitores do Alabama fizeram o impensável: elegeram um democrata", escreveu o analista John Hudak, da Brookings Institution. Para ele, a escolha se deu para afastar um suposto predador sexual da tarefa de representar o Estado.

Voto negro
Moore pediu a recontagem dos votos — Jones recebeu 49,9%, e ele, 48,4%. "Fomos pintados de forma desfavorável e irrealista nesta campanha", afirmou o republicano.

O ex-juiz saiu-se mal com o eleitorado do próprio Trump: analistas estimam que ele obteve só 49% dos votos que o presidente teve no Estado, prejudicado por uma alta abstenção nesse grupo. No Alabama, brancos são 75% do eleitorado; nesta terça, porém, corresponderam a 66% dos votantes (dos quais 68% preferiram Moore, indicou a boca de urna da CNN).

O voto nos EUA não é obrigatório. O comparecimento tende a ser menor em eleições legislativas, e mais baixo ainda em eleições extemporâneas como esta, marcada para preencher a vaga do hoje secretário da Justiça Jeff Sessions. Desta vez, ficou em 40%.

O que se provou crucial foi o eleitorado negro. Embora perfaçam 26% das pessoas aptas a votar no Estado, eles responderam por 29% dos votos desta vez —e 96% escolheram Jones. Mulheres negras foram 17% dos que votaram (98% delas, no democrata; entre as mulheres em geral, Jones venceu com 57%).

O número impressiona se considerado que, no sul dos EUA, grande parte da população negra se abstém por acreditar que seu voto não terá peso ou por obstáculos legais como a exigência de um documento com foto. Nos EUA, não há RG, e a maioria usa carteira de motorista ou passaporte, mais raros entre a parcela mais pobre (e negra).

A vantagem de Jones apareceu sobretudo nas áreas de concentração de afro-americanos. Em alguns desses condados, o democrata chegou a receber 80% dos votos.

Parte da explicação está na campanha de Moore. Conservador e contrário aos direitos LGBT, ele chegou a afirmar que as famílias eram mais unidas na época da escravidão. Já Jones, promotor, processou integrantes da organização racista Ku Klux Klan.

"Moore é um constrangimento", disse o ex-jogador de basquete Charles Barkley, do Alabama. "Se qualquer outro homem fosse acusado de abuso sexual por oito mulheres, falasse de escravidão e de homossexuais na cadeia, nem estaria na eleição."

Além dos republicanos que ficaram em casa, muitos preencheram a cédula com um nome de fora da disputa em protesto. Houve 22.810 votos assim —mais que a margem de Jones, de 20.715 votos. 

(Fonte: Folha de S. Paulo)