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Sem crise: o A380 ainda garante clima de euforia na matriz

Publicado: 04 Novembro, 2008 - 00h00

Escrito por: CNM CUT

Não espere sentir em Toulouse, onde fica a sede da Airbus, um clima sombrio por conta dos problemas que cercam a indústria da aviação comercial e, em especial, a própria empresa. No meio de um processo em que se vê obrigada a fechar fábricas e demitir para recuperar rentabilidade, a Airbus comemora o avanço no volume de vendas em relação à arqui-rival Boeing. Ali mesmo em Toulouse, ainda se faz também muita festa em torno do A380, o maior jato do mundo, que começou a operar há um ano. 

Os aviões da Airbus aparecem até em cartões postais de Toulouse, cidade histórica e turística, conhecida pela paisagem dos canais que cruzam a área central. Diante do assédio dos turistas curiosos, a empresa teve de organizar os passeios. O diretor de marketing e produto, Alan Pardoe, conta que foi preciso transferir para uma empresa terceirizada o serviço de visitas à Airbus, que tem longas filas de espera. 


Por causa da cor dos tijolos das construções no centro histórico, Toulouse é conhecida na França como a "ville em rose", numa alusão à música que consagrou a cantora Edith Piaf ("La vie en rose"). Mas nem tudo é cor-de-rosa na Airbus. A empresa está sendo prejudicada pela desvalorização do dólar. Os preços dos aviões são fixados na moeda americana enquanto a maior parte dos custos é em euros. 


"Precisamos elevar a quantidade de fornecedores que cobram em dólares", diz Pardoe, um executivo que está muito mais atento ao que acontece com câmbio e petróleo do que no mercado financeiro. 


A empresa já começou a trilhar seu caminho na busca de centros de produção de baixo custo com a inauguração da fábrica na China. Em processo de produção crescente por acreditar que o tráfego aéreo vai continuar dobrando a cada 15 anos, a diversificação geográfica vai, de certa forma, compensar o fechamento de fábricas na Europa. O plano de reestruturação em curso está sob o comando da empresa que controla a Airbus: a EADS (European Aeronautic Defence and Space). 

Chamado de Power 8, o plano prevê a redução dos custos anuais em 2,1 bilhões de euros a partir de 2010. Além disso, a empresa espera gerar aumento de 5 bilhões de euros no fluxo de caixa entre 2007 e 2010. O enxugamento prevê o corte de 10 mil empregos e a venda ou fechamento de seis fábricas. A Airbus precisa perseguir a rentabilidade para não enfrentar problemas com o seu atual projeto, o A350, que vai ao ar em 2013. 

Os tropeços que provocaram atrasos na entrega dos primeiros A380 parecem resolvidos. O principal executivo da Airbus, Thomas Enders, diz que os atrasos não envolveram o projeto em si, mas a adaptação dos acabamentos das aeronaves aos pedidos dos clientes. "Subestimamos a complexidade do avião; não estávamos à altura desse desafio", afirma. 

Não se pode nunca descuidar dos riscos que a construção de um avião gigante pode trazer. A Airbus usa vias rodoviárias, marítimas, fluviais e aéreas para transportar as peças do A380. Na Europa, já ficaram famosos os comboios noturnos dos caminhões que transportam componentes do superjumbo. Esses comboios ocorrem quatro vezes por mês e atraem dezenas de curiosos para a beira das estradas. 

É fácil imaginar, por exemplo, como a chegada adiantada das asas de um A380 pode atrapalhar o processo de manufatura, como aconteceu recentemente. Para se ter uma idéia, a medida da envergadura do A380 é de 79,80 metros. 

Muitos dos que trabalham no que pode ser chamada de cidade Airbus - um enorme complexo de edifícios com 12 mil empregados - parece sentir-se um pouco parte da história do A380. Os mais ligados ao projeto esperam que o assunto ainda atraia tanto interesse como no primeiro vôo do jato, em abril de 2005. Em Toulouse há até filas de voluntários para os testes que ainda são realizados 

No comando dos testes está Jacques Rosay, experiente e simpático piloto que não se cansa de percorrer os 555 metros quadrados do A380. A aeronave em que ele trabalha foi feita para os testes. Além da parafernália de instrumentos e fiação, o A380 de testes não conta com o tradicional acabamento, como assentos e outros acessórios. Leva inúmeros barris para simular o peso dos ocupantes e mais uma dúzia de assentos para mecânicos, voluntários e outros curiosos. Gente demais para o gosto de Rosay. Mas, como ele compara, o A380 "é como os Rolling Stones; todo mundo vai atrás". Além de ser o comandante dos testes , Rosay foi também quem pilotou o A380 no vôo inaugural há três anos e meio. 

Quem tem a chance de entrar no simulador de vôo do A380 vive uma emoção à parte. Patrice Dewitte, o instrutor chefe, coloca emoção e um alto grau de realidade em cada decolagem e pouso. Ele garante que o simulador do A380 não permite "fazer loucuras porque o equipamento dispõe de mecanismo de proteção". Quem "voa" tendo Dewitte como co-piloto e utilizando a cidade da Airbus como paisagem, também "simulada", consegue ver até o quarteirão onde está a casa dele, além da riqueza de detalhes do estádio, catedral e outras atrações de Toulouse. 

E também é considerada pela direção da empresa uma atração à parte a maquete do A380, em tamanho original do avião, que oferece aos clientes inúmeras idéias de acabamento. Com seu enorme avião de dois andares, a Airbus melhorou a condição de quem viaja na classe econômica, proporcionando mais espaço e maior área para estender as pernas. A companhia criou um avião que pode ter bares nas áreas entre cabines, balcão de recepção, uma cabine à parte para a tripulação descansar e até chuveiros. 

Mas, dependendo do gosto do freguês, esse avião pode levar 853 passageiros se todos viajarem na classe econômica. Ou 525 se divididos entre as três classes tradicionais. No extremo do luxo, a aeronave pode até se transformar em um verdadeiro palácio voador. 

Primeira cliente do superjumbo, a Singapore Airlines optou por uma versão de 471 passageiros. A companhia criou a cabine "suítes", considerada uma classe além da primeira, com portas deslizantes em cada compartimento do passageiro. 

Há quem queira exclusividade nos ares. É o caso do príncipe Alwaleed Bin Talal, da Arábia Saudita, que encomendou um só para ele. Analistas estimam que o interior desse avião particular poderá custar até US$ 200 milhões. O preço do A380 está em torno de US$ 285 milhões. 

Desde a chegada do 747, em 1969, a Boeing dominava o mercado das aeronaves para mais de 350 passageiros. Em 2006, a americana perdeu a liderança de entregas para a concorrente européia. 

O A380 continua sendo a maior aposta da Airbus para o futuro. O maior avião comercial em operação no mundo traz economia de combustível de até 20% por assento, segundo a empresa. A aeronave ganhou leveza graças a novas ligas e fibras especiais. 

A direção da Airbus garante que o pouso de um A380 não provoca transtornos nos aeroportos. A aeronave já está sendo usada em mais de 70 aeroportos. A Air France, que ainda está para receber o seu primeiro A380, já providenciou obras no aeroporto Charles de Gaule, em Paris, para que desembarque em dois pavimentos. 

Mas como seria um avião desses em Cumbica, em São Paulo? A Airbus, que não esconde o desejo de vender um A380 para para seu principal cliente no Brasil, a TAM, se desdobra em explicações para tentar provar as vantagens de seu jumbo em aeroportos lotados. 

Um dos principais argumentos da empresa é que é mais fácil embarcar e desembarcar muitos passageiros em um único avião do que em vários. A responsável pelo relacionamento com os clientes do A380, Susana Martin-Romo, lembra que vôos de longa duração, como os de 10 ou 12 horas, partindo do Brasil para a Europa, saem em horários específicos (fim da noite ou meio da tarde). "Como não é possível aumentar as freqüências, ou se fazem aeroportos maiores ou aumentamos o tamanho das aeronaves", diz.

Fonte: Valor